quarta-feira, 8 de setembro de 2010

De sons e términos

     Sentou-se na beirada da cama, de modo que não mais o via. Terminava de arrumar as malas para ocupar as mãos e o pensamento, longe de estar distante: finalmente caía em si.
     Passados alguns dos momentos mais longos que vivera, ele levantou-se, apanhou os cigarros e, enquanto acendia um deles, recostou-se novamente nos travesseiros. Atento ao que acontecia, não deixou de perceber que ela mexia meticulosamente na carteira, como quem virava a última página de um livro que não queria terminar de ler.

_ Quanto ficou o almoço?
_ Nada, não.

     Sem dar ouvidos, depositou o dinheiro na escrivaninha, apesar dos protestos do outro.
     Não se olhavam mais, mas de onde estava ele podia perceber a figura daquela que minutos antes havia desabado e tentava se conter.
     Cansado de lançar olhares que gritavam por palavras, fossem elas quais fossem, resignou-se àquele silêncio quase morto e passou a atentar-se aos sons que os rodeavam: suspiros, o fogo que crepitava em algum lugar lá fora, carros passando e uma música distante. Era Beatles. Até a fumaça da rua que se misturava à do cigarro recentemente lançado ao cinzeiro parecia ecoar em seus ouvidos argutos. Então, estendeu a mão e acendeu mais um, tentando continuar preenchendo o silêncio, que lhe costumava ser tão caro. Sentia-se tragando a culpa, que não era sua. Sempre soubera da fugacidade da maioria das coisas humanas, já estivera ali antes, mas ainda assim sentia o famoso gosto amargo do fim. Mais que isso, novamente padecia a dor de ambos.
     A hora se aproximava e num movimento repentino ela sentou-se no chão, tentando fita-lo uma última vez. Sem sucesso. Queria mesmo encarar aquele quarto no qual tiveram incontáveis ótimos momentos, porém agia como se quisesse registrar o único que havia sido ruim - atitude que lhe era típica.
    
_ Que horas são? - ela disse.

     Era a hora. As lágrimas e as esperanças que restavam ficaram no travesseiro amarelo tão peculiar, o mesmo que tantas vezes acolhera seu sono e seus cabelos escuros.
     Ele fitou seus olhos vermelhos através da fumaça e, enfim, levantaram-se. As poucas palavras que trocaram foram tão vazias que mal ousaram se tocar, e o último abraço foi tão curto quanto cruel.

1 comentários:

Nat disse...

Como que nao chora?

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